1200. A comparação fica facilitada pelo fato de que grande número de conceitos culturais nossos não eram conhecidos dos tupis. Povo de comércio rudimentar, baseado na troca, não desenvolveu a arte de contar, e muito menos a respectiva nomenclatura lingüística, que mal chegava a 4. Ignorava verdadeiras medidas, pesos e moedas. Incipiente noção de "paga" epy (t), ou melhor "troca", "resgate", que ainda distava do conceito de "preço" ou "valor". Ao procurarmos traduzir um nome ou uma frase para o tupi (é o que se pede a cada passo de quem estuda a língua), a preocupação inicial deve ser a de verificar se o povo que falou tupi teve conhecimento dos elementos culturais que desejamos traduzir. Seria um contra-senso verter para o tupi nomes de cousas intdramente ignoradas por aquêles índios, como "rádio", "automóvel", "bom dia", "viva!", etc. "Campo de aviação" por exemplo, não tem tradução em tupi, pois os índios tupis não conheceram o "avião". Mas, não se pode encontrar uma tradução para "avião", suponhamos: ygá'-bebé "canoa-voadora"? A expressão é compreensível e talvez os índios a viessem a usar, se tivessem tido conhecimento do avião. Como também poderiam traduzir de outra forma, p. ex., gûyrá-gûasu "pássaro-grande", ou adaptar a palavra portuguêsa. O certo é que essas expressões, no sentido que se lhes dá, não são tupi. Podem divertir, mas carecem de valor lingüístico. Estudar tupi é investigar a língua que os índios realmente falaram e não excogitar como a falariam hoje. Proceder de outro modo é falar português… com palavras tupis. SÊRES DELIMITADOS E INDELIMITADOS1201. Além dessas divergências, mais culturais, há inúmeras outras que, embora de cunho lingüístico, são condicionadas por uma tradição conceptual própria. Assinalamos aqui apenas algumas. As línguas ocidentais costumam distinguir lingüisticamente duas espécies de nomes: 1º) nomes de sêres delimitados ou indivíduos (p. ex., homem, céu, arco, etc.); 2º) nomes de massas ou sêres indelimitados (p. ex., água, carne, farinha, ar, madeira, cabelo), cujas partes podem verificar também a natureza do todo. Para individuar ou delimitar êstes últimos nomes, nossas línguas recorrem a locuções em que entra um nome de cousa limitada (p. ex. copo, porção, feixe, litro, grão, fio, etc.), ligado ao nome da "massa" pela preposição "de": |
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