Raramente se encontrará num só livro tamanha massa de dados (geológicos, botânicos, zoológicos, limnológicos, meteorológicos, antropológicos, etno-históricos, arqueológicos) que, integrados e magistralmente interpretados, ofereçam visão global da adaptação do homem aos trópicos.
Betty Meggers procura, preliminarmente, recriar o ambiente amazônico, levando o leitor a perceber nele os conteúdos edênicos (o paraíso tropical) e deletérios (o inferno verde) que lhe vêm sendo atribuídos há séculos. A Amazônia é vista pela autora como um ecossistema, formado pela seleção natural evolutiva, em que os diversos elementos da flora e da fauna não competem entre si, senão que recebem e transmitem os nutrientes de que cada qual carece para estabelecer um equilíbrio biótico necessário à sobrevivência de todos.
Analisa, em seguida, a exploração predatória de recursos naturais por parte do civilizado, que vem exaurindo o grande rio e seus afluentes. Exemplifica essa depredação (em alguns casos irreversível) pela destruição de espécies vegetais infinitamente diversificadas e sua substituição por uma espécie única. É o caso do plantio da seringueira, que resultou num rotundo fracasso para a produção da borracha, no início do século. E, recentemente, a derrubada maciça e indiscriminada da portentosa floresta por tratores de corrente para a exploração madeireira ou a simples queima (vista pelos satélites artificiais, a Amazônia é a maior fogueira do mundo), seguida pela semeadura de capim. Ou, ainda, a rapina de elementos da fauna, como o jacaré, a tartaruga, as aves de mais bela plumagem, para uma superexploração mercantil. A conseqüência mais deletéria de tais práticas é a ruptura do equilíbrio biológico e a destruição dos mananciais e do solo. Este é extremamente pobre na Amazônia, não obstante a luxuriosa vegetação que o cobre. Assim, a camada de terra vegetal, quando revestida de árvores, não ultrapassa dez centímetros de espessura. Abatidas estas para o plantio de pastagens, o humus se reduz a meio centímetro que é carreado pela erosão e a lixiviação, fazendo aflorar areões em algumas áreas.
A profusão de dados coligidos por Betty J. Meggers permite visualizar os danos irreparáveis que o modo de exploração vigente na Amazônia (56% do território nacional) está causando ao País. Este é o maior desafio com que a atual geração de brasileiros se defronta. Daí sua advertência: rompido o sistema natural, que criou um habitat favorável numa região adversa, se produzirá um desastre ecológico do qual o Homem será a maior vítima. A par da advertência, porém, ela indica soluções, todas relacionadas a uma exploração racional e recriadora das riquezas amazônicas.
Betty Meggers é arqueóloga. Como tal, vê a evolução humana desde uma perspectiva proveniente do passado, mas voltada para o futuro. Embora não trate de questões teóricas, a teoria flui naturalmente de seus dados, embasada por uma preocupação científica e humana com esse imenso e belo quadrante da terra e seus habitantes, cujo destino se confunde com o próprio destino do Homem, podendo representar sua ruína ou sua salvação.
Berta G. Ribeiro
[Das orelhas]