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ANONIMO ("A Redacção")
  • O chefe indio Quoniambebe. Revista trimensal de Historia e Geographia ou Jornal do Instituto Historico e Geographico Brasileiro XIII (1850), segunda edição, Rio de Janeiro 1872, p. 517.

Sob êsse título e subscrito "A Redacção", lemos o seguinte: "Não é por sentimentos de admiração por um chefe bárbaro da raça que havia invadido êste território antes que a êles chegassem, com a civilização e cristianismo, nossos pais, nem para render culto a um bruto e vingativo sacerdote da antropofagia americana, que nos propusemos a fazer aparecer em todo o seu relêvo o chefe índio de cujo retrato tomado por Thevet (quando aqui esteve no Rio em 1557 com Villegangnon) damos na estampa um fac-símile, tão exato quanto possível: - é por amor da verdade histórica; é para que admirem os que admirar quizerem (não nós) êsse cabecilha, que por anos foi o terror e o senhor despótico de todo o território e da costa e mar que corre desta baía até Santos. Filósofos admiradores da selvageria! Vêde-vos nesse espelho: dizei se vos lisongeáveis de ser governados por um homem-fera, que se gabava, por proeza, de ter tragado um sem número de seus semelhantes, avaliados em dez mil por Thevet, que lhe chama le plus redoute diable de todo o país. Há sim na guerra um ponto de contacto entre a civilização e a barbaria; mas o homem civilizado reconhece na mesma guerra um recurso último, a última ratio regum, proveniente ainda da insuficiência do direito humano; e o bárbaro guerrea e faz mal só para obedecer a instintos brutais, que êle mesmo não sabe explicar, nem definir. Por agora porém não façamos juizos preventivos acêrca dêsse gentio célebre que ocupará um papel importante na nossa história, quando ela se escreva."

É impressionante que a redação da revista científica mais representativa do Brasil daquela época, revista essa na qual até então, isto é, até 1850, já tinham sido dadas a lume obras importantíssimas para a Etnologia Brasileira, se desculpe de tal maneira pela reprodução duma xilogravura quinhentista que mostra um índio de aspecto mais sonolento do que feroz. Em todo caso, êsse ato caracteriza a mentalidade com que, em meados do século XIX, certos membros da elite intelectual dêste país encaravam os índios, formando contraste com o indianismo de Gonçalves Dias e José de Alencar, sem ser, por isso, mais objetiva do que êste.

(p. 69-70)

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